Todo mundo
repara ou lembra quando empenhou a primeira vez eu te amo numa relação.
Qual o
momento exatamente. O dia, a hora, os minutos. Após o sexo, embevecido. Ou no
cinema escorregando as palavras num beijo. Ou antes, de um aceno ao trabalho.
Aquele eu te
amo que rodopiou na garganta até ganhar a forma da boca. Aquele eu te amo que
fora ensaiado em diversos momentos de alegria, e recuou por vergonha.
Quando ele
vem, é um balbucio: estranho, inseguro, desajeitado como um pedido de desculpa.
Sim, o
primeiro “eu te amo” é um pedido de desculpa:
– Desculpo,
eu te amo.
– Desculpa,
eu me ferrei.
– Desculpa,
não quis só que aconteceu.
O primeiro
eu te amo é uma série vitoriosa de fracassos. Fracasso da amizade (não consigo
ser mais seu amigo). Fracasso da independência (não consigo mais viver longe de
você). Fracasso da mentira (não consigo mais mentir para você).
A declaração
aparece tímida. Temos que sempre repetir – este é o constrangimento. O primeiro
eu te amo nunca é ouvido. E ainda enfrentaremos a pergunta desconfiada de nossa
companhia: “O que você disse?”.
Ai, como é
sufocante. Muitos mentem e, já acovardados, não insistem. Expor o eu te amo
parte de uma tontura, repetir é embriaguez.
O primeiro
eu te amo surge com voz de adolescente, aquele timbre indefinido, arenoso:
metade infância, metade adulto. Soprado, sussurrado, comovido.
É um caminho
sem volta. Um desabafo que se consome em decisão e que se impõe como destino.
Depois não tem como alegar que errou, que se confundiu, não há retratação
possível, seu advogado não poderá construir nenhuma versão convincente para
desfazer o mal-entendido.
Mas o
primeiro eu te amo, ainda que represente uma estréia da vida a dois, é discreto
diante de outro movimento dos lábios que costuma passar despercebido.
Quando
chamamos o nosso par de “Meu Amor”. Quando personificamos o Amor.
Quando ele
deixa de ser um nome, alguém, para ser o nosso próprio sentimento.
Quando
abandonamos seu registro, seu batismo, para tratá-lo como se fosse a nossa
emoção encarnada.
Não tem como
consertar, a projeção virou realidade. É quando realmente confiamos nossa
individualidade.
É amor para
cá, é amor para lá, é amor para acordar, é amor para dormir, é amor para pedir
qualquer coisa, é amor no e-mail, no telefone, nos cartões. É amor amor amor
infinito, dobrado, multiplicado, incansável.
Está feito o
estrago. Se nos despedirmos, se nos separarmos, não estaremos nos afastando de
uma pessoa, e sim do Amor.
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